História da Aviação Naval Brasileira – 1913 a 1941

Os primórdios

Os primeiros voos de aviões foram realizados no Brasil em 1910. Como inexistiam escolas de pilotagem no Brasil, aqueles militares que desejavam o brevê procuravam-nas em outros países. Assim, temos o 1º piloto militar brasileiro, Ten. Jorge Henrique Moller, da Marinha de Guerra, brevetado em 29 de abril de 1911 pela Escola Farman (França).

A Escola de Aviação Naval

Frente aos avanços de outras Armadas, a Marinha de Guerra brasileira resolve, em 1916, criar o seu serviço de aviação. Já em 22 de agosto de 1914, havia sido criada a Escola de Submersíveis e Aviação, a qual aparentemente não chegou a ser organizada. Agora, no entanto, os momentos eram de crise, pois a I Guerra Mundial já durava dois anos. O dia 23 de agosto de 1916 viu a criação da Escola de Aviação Naval – EAvN. Em novembro do mesmo ano foram incorporados à Esquadra três aerobotes Curtiss F. A escola formou inúmeros oficiais e sargentos, tanto da Marinha como do Exército (o qual ainda não tinha sua própria escola de aviação).

A I Guerra Mundial

Em agosto de 1914, deflagrou-se na Europa um conflito que logo tomou proporções gigantescas, vindo a engolfar todo o mundo. De um lado, os Impérios Alemão e Austro-Húngaro; de outro, os Impérios Britânico, Francês e Russo. Outros países viriam a juntar-se ao conflito no seu decorrer, forçados a tanto por terem sido alvo de agressões, como por exemplo os Estados Unidos da América.

Assim foi também com o Brasil, o qual conseguiu manter a neutralidade até 1917. No dia 3 de abril de 1917, um submarino alemão torpedeou o navio mercante brasileiro “Paraná”, navegando próximo à costa francesa; tal ato levou ao rompimento das relações diplomáticas com o Império Alemão. Com o torpedeamento dos navios brasileiros “Tijuca”, “Macau”, “Tupi”, “Acari” e “Guaíba”, o Brasil declarou guerra àquele Império em 26 de outubro de 1917.

A participação brasileira durante o conflito refletiu-se no envio de navios da Marinha de Guerra à Dakar (noroeste da África), a chamada Divisão Naval em Operações de Guerra, para efetuar operações de proteção a comboios em uma área que se estendia pelo Atlântico de Dakar a Gibraltar.

No tocante à Aeronáutica, os seguintes desenvolvimentos ocorreram:

  • Oficiais do Exército e da Marinha foram enviados à Grã-Bretanha, em janeiro de 1918, a fim de receberem treinamento em pilotagem de aviões junto ao Royal Naval Air Service – RNAS (o antigo corpo aéreo da Marinha Real britânica). Esses oficiais foram treinados nas estações aeronavais de Eastbourne, Lee-on-Solent e Calshot; dois oficiais faleceram nesse período devido a acidentes. Após o treinamento, aqueles oficiais desempenharam missões de guerra, integrando uma esquadrilha da então recém-criada Royal Air Force – RAF (Força Aérea Real britânica), a qual contava com pilotos brasileiros, norte-americanos e britânicos.
  • Em março de 1918, a Escola de Aviação Naval recebe uma Missão Militar Americana. A EAvN recebeu 6 Curtiss HS-2 de patrulha, 2 F.B.A. de reconhecimento, 4 Curtiss F e 2 Standards de instrução. Um outro Curtiss F foi construído nas oficinas da Escola.
  • Em fins de 1918 oficiais e praças da Marinha foram enviados à Itália para receberem instrução.
Aviadores navais brasileiros em treinamento no Reino Unido, durante a I Guerra Mundial.

A Escola de Aviação Naval em 1919

A Escola de Aviação Naval avançava a passos largos. No dia 15 de agosto de 1919, é realizado o primeiro vôo aeropostal da Marinha, inaugurando-se o Correio Aéreo da Esquadra, precursor do Correio Aéreo Naval. A EAvN adquire, em 1919, dois Farman F-41, quatro Curtiss N-9, dois Ansaldo ISV A, um Macchi M7 e cinco Macchi M9; em 1920, foram adquiridos aviões Avro 504K, bem como dois Farman F-51, quatro Curtiss N-9 e quatro Aeromarine; um Curtiss MF foi doado pelo governo norte-americano.

Centros de Aviação Naval

Em julho de 1922 foi criado o Centro de Aviação Naval do Rio de Janeiro (situado na Ponta do Galeão) e, em outubro do mesmo ano, o Centro de Aviação Naval de Santos. Esses centros foram os pioneiros no estabelecimento da Aviação Naval como responsável pela defesa aérea do litoral do Brasil.

Criação da Defesa Aérea do Litoral

Em 18/11/1923, foi criada a Defesa Aérea do Litoral (DAL), à qual ficaram subordinadas a Escola de Aviação Naval e os centros de aviação naval do Rio de Janeiro, de Santos e de Santa Catarina (em Florianópolis). A DAL foi extinta logo em seguida, sendo criada em seu lugar a Diretoria de Aeronáutica da Marinha, em 5/12 do mesmo ano.

A Revolução de 1924

A Aviação Naval participou da campanha, enviando as 1ª e 2ª esquadrilhas, equipadas com aviões Curtiss F-5L, Curtiss MF e HS-2L. Essas esquadrilhas realizaram missões de reconhecimento em apoio ao bloqueio naval do porto de Santos. No norte do país, para onde o movimento havia se espalhado, a Aviação Naval realizou missões contra os rebeldes.

Estrutura das unidades aéreas em 1926

As unidades aéreas da Aviação Naval estavam organizadas em quatro flotilhas:

  • Flotilha de Caça, com três esquadrilhas, equipadas com o Sopwith 7F1. Snipe;
  • Flotilha de Reconhecimento, com três esquadrilhas, equipadas com o Ansaldo SVA-10;
  • Flotilha de Bombardeio, com três esquadrilhas, equipadas com o Curtiss F-5L;
  • Flotiha de Instrução, com três esquadrilhas:
    • 1ª Esquadrilha (hidroaviões Curtiss N9H)
    • 2ª Esquadrilha (aerobotes Curtiss MF)
    • 3ª Esquadrilha (Avro 504K e Curtiss JN-4D)
O estandarte da Aviação Naval. Aprovado pelo Decreto nº 20.090, de 11 de junho de 1931, foi usado até a extinção da Aviação Naval, em 20/01/1941.

Criação do Corpo de Aviação da Marinha

Em 3 de outubro de 1931, através do Decreto nº 20.479, é criado o Corpo de Aviação da Marinha, estabelecendo o Quadro de Aviadores Navais e das demais especialidades afeitas à Aviação Naval.

Incorporação dos hidroaviões Savoia Marchetti SM.55A

No ano de 1931, a AvN adquiriu onze hidroaviões Savoia Marchetti SM.55A. Estes aviões haviam sido trazidos ao Brasil no memorável reide Roma-Rio de Janeiro, realizado pela Regia Aeronautica (Real Força Aérea Italiana), sob o comando do Gen. Italo Balbo.

A Revolução de 1932

A Revolução Constitucionalista foi movida por lideranças do estado de São Paulo contra o governo de Getúlio Vargas, líder do movimento de 1930 e presidente desde então. A revolução foi deflagrada na noite de 9 para 10 de julho de 1932 e teve a duração de 85 dias; como os rebeldes não obtiveram o apoio dos demais estados (especialmente do Rio Grande do Sul), logo viram-se cercados por tropas legalistas e foram forçados a lutar em três frentes, nas fronteiras com os estados do Paraná, Rio de Janeiro e Minas Gerais.

Do lado legalista, a Aviação Naval contribuiu com quatro Vought O2U-2A Corsair da 1ª Divisão de Observação; três Martin PM-1B e sete Savoia-Marchetti SM.55A da Flotilha Mista Independente de Aviões de Patrulha, bem como doze de Havilland D.H. 60T e dois Avro 504K.

No dia 18 de julho, dois Corsair da Aviação Naval foram atacados pela artilharia antiaérea enquanto realizavam uma missão de reconhecimento armado; no decorrer desta interceptaram um Potez rebelde que conseguiu evadir-se. No dia 21, os Corsair da Aviação Naval destruíram importante depósito de munições rebelde. No dia 29, um SM.55A escoltado por um Corsair realizam ataque a posições rebeldes em Cubatão, sem, no entanto, obter resultados significativos. Nos dias 3 e 5 de setembro, três SM-55A escoltados por um Corsair atacam com sucesso o Forte de Itaipu, ocupado pelos rebeldes, causando severos danos.

Ainda durante a revolução de 1932, o governo adquiriu 14 aviões de caça Boeing 256 nos EUA, seis dos quais foram destinados à Aviação Naval e os oito restantes à Aviação Militar (do Exército).

A primeira esquadrilha de demonstração aérea

Em 1932 a AvN organiza uma unidade de demonstração aérea, equipada com três aviões Boeing 256 e tendo como integrantes: Capitão-de-Corveta Djalma Fontes Cordovil Petit, Capitão-Tenente Lauro Oriano Menescal e Capitão-Tenente José Kahl Filho. A esquadrilha logo atraiu a atenção pela precisão com que as manobras aerobáticas eram realizadas. Em janeiro de 1933, foi convidada a participar da cerimônia de inauguração do Aeroporto Internacional de Montevidéu; nos meses de agosto a outubro do mesmo ano, acompanhou o Presidente Getúlio Vargas em viagem às capitais do norte do Brasil. No seu regresso ao Rio de Janeiro, a 5 de outubro, escoltou o dirigível alemão “Graf Zepellin”.

Reorganização das Unidades Aéreas

A chegada de aeronaves modernas permitiu a reorganização das unidades aéreas, em fins de 1932. Foram criadas a Defesa Aérea do Litoral e a Força Aérea da Esquadra:

  • Defesa Aérea do Litoral, composta por seis Divisões:
    • 1ª Divisão de Caça (1ª DC), Rio de Janeiro (RJ): seis Boeing 256.
    • 2ª Divisão de Observação (2ª DO), Rio de Janeiro (RJ): seis Vought V-66B Corsário.
    • 1ª Divisão de Esclarecimento e Bombardeio (1ª DEB), Ladário (MS): cinco Fairey Gordon.
    • 2ª Divisão de Esclarecimento e Bombardeio (2ª DEB), Porto Alegre (RS): cinco Fairey Gordon.
    • 3ª Divisão de Esclarecimento e Bombardeio (3ª DEB), Florianópolis (SC): cinco Fairey Gordon.
    • 4ª Divisão de Esclarecimento e Bombardeio (4ª DEB), Rio de Janeiro (RJ): cinco Fairey Gordon.
  • Força Aérea da Esquadra, composta por cinco Divisões, todas com sede no Rio de Janeiro (RJ):
    • 1ª Divisão de Patrulha (1ª DP): cinco Savoia-Marchetti SM.55A e dois Martin PM-1B.
    • 1ª Divisão de Observação (1ª DO): quatro Vought O2U-2A Corsário e dois Vought V-66B Corsário.
    • 1ª Divisão de Treinamento (1ª DT): oito Waco CSO.
    • 1ª Divisão de Instrução (1ª DI): de Havilland D.H. 60T Moth Trainer e de Havilland D.H. 83 Fox Moth (Escola de Aviação Naval).

Reorganização da Defesa Aérea do Litoral

Em 1933, através do Decreto nº 22.570, de 23 de março daquele ano, a Defesa Aérea do Litoral foi reestruturada em cinco setores: Norte (Belém – PA), Nordeste (Natal – RN), Centro (Rio de Janeiro – RJ), Sul (Florianópolis – SC) e Sudoeste (Ladário – MS).

Criação das Flotilhas

Em setembro de 1933, as divisões de esclarecimento e bombardeio, as divisões aéreas de observação e a divisão de patrulha foram dissolvidas, sendo criadas três flotilhas em seus lugares:

  • 1ª Flotilha de Esclarecimento e Bombardeio, equipada com aviões Fairey Gordon;
  • 1ª Flotilha de Observação, equipada com aviões Vought O2U-2A Corsário e Vought V-66B Corsário;
  • 1ª Flotilha de Patrulha, equipada com aviões Savoia-Marchetti SM.55A e Martin PM-1B.

Guerra do Chaco

Em 1934, por ocasião da guerra do Chaco – envolvendo a Bolívia e o Paraguai – a Aviação Naval deslocou aviões Boeing 256 e Vought V-66B Corsair II para a fronteira do Brasil com aqueles dois países.

Criação do 1º Grupo Misto de Combate, Observação e Patrulha

Devido à baixa disponibilidade que afetava praticamente todos os meios aéreos disponíveis na Aviação Naval, entre 1933 e 1934, foi criado o 1º Grupo Misto de Combate, Observação e Patrulha em novembro de 1935, sediado no Rio de Janeiro e fundindo as aeronaves e tripulações da 1ª Divisão Aérea de Patrulha (pertencente à Força Aérea da Esquadra) e de duas divisões da Defesa Aérea do Litoral (Centro), a 2ª Divisão de Aviões de Observação e 1ª Divisão de Caça. O 1º GMCOP foi organizado no primeiro trimestre de 1936.

A Aviação Naval e a Indústria Aeronáutica

Na segunda metade da década de 30, a AvN passou a incorporar aviões projetados pela firma alemã Focke-Wulf; como fruto dessa associação, uma fábrica foi instalada no Galeão, produzindo aviões FW-44J Stieglitz e FW-58B Weihe, incorporados a partir de 1936 e 1938, respectivamente. Também doze aviões de treinamento norte-americanos North American NA-46 entraram em serviço em 1938.

Os reides aéreos

Os reides aéreos foram importantíssimos para o desenvolvimento da aviação no Brasil, por possibilitar o aprimoramento das tripulações em voos de longo alcance. Dentre os reides realizados por tripulações da Aviação Naval, destacam-se:

  • Rio de Janeiro – Vitória – Salvador – Aracaju, de 1º a 19 de julho de 1923: primeiro reide de uma esquadrilha da Aviação Naval;
  • Rio de Janeiro – Juiz de Fora – Belo Horizonte, 3 de agosto de 1926;
  • Argentina e Uruguai, 1931: aviões SM-55A da Aviação Naval;

O Correio Aéreo Naval

Em 1934, foi criado o Correio Aéreo Naval; atendendo linhas ao longo do litoral sul-brasileiro, entre as cidades de Rio Grande e Rio de Janeiro. Eram utilizados hidroaviões WACO CSO e WACO CPF F-5, e aviões WACO CPF F-5 e WACO CJC Cabine. Em 1940, a Marinha adquiriu quatro Beechcraft D-17A para serem utilizados pelo Correio Aéreo Naval em rotas ligando o Rio de Janeiro até Belém; porém tais rotas não funcionaram regularmente.

Criação do 1º Grupo de Observação e Caça

Em março de 1937, o 1º Grupo Misto de Combate, Observação e Patrulha foi extinto. Em seu lugar, foi criado o 1º Grupo de Observação e Caça, equipado com os Boeing 256 e Vought V-66B Corsair II.

A extinção da Aviação Naval

Em janeiro de 1941, os acontecimentos na Europa levaram o governo brasileiro a centralizar em um único comando as operações aéreas das forças militares brasileiras, e com isso surgiu o Ministério da Aeronáutica, cujo primeiro titular foi o Dr. Salgado Filho; a Aviação Militar (do Exército) e a Aviação Naval foram extintas – seus efetivos pessoais e equipamentos foram transferidas para uma nova Força militar, chamada de Forças Aéreas Nacionais. No dia 22 de maio de 1941, após exposição de motivos do Sr. Ministro da Aeronáutica, as Forças Aéreas Nacionais tiveram sua denominação alterada, pelo governo, para Força Aérea Brasileira.

Da extinta Aviação Naval foram transferidos à FAB as seguintes aeronaves, com as respectivas quantidades indicadas entre colchetes: Beechcraft D-17A [3], Boeing 256 [2], de Havilland DH-60T [1], de Havilland DH-82/DH-82A [10], de Havilland DH-83 [2], Fairey Gordon [4], Focke-Wulf 58B [16], Focke-Wulf 44J [36], Luscombe Phantom [1], North American NA-46 [12], Stinson 105 [1], Vought V-66B [1], Waco CSO [3], Waco CPF F-5 [4], Waco CJC [3].

As aeronaves mais modernas eram os FW-58B, os quais foram colocadas em serviço pela FAB em missões de patrulha antissubmarina, durante a II Guerra Mundial; já os NA-46 foram utilizadas para instrução de pessoal. Outras aeronaves, como os Waco, foram colocadas em serviço nas linhas do Correio Aéreo Nacional, ao passo que as mais antigas foram declaradas obsoletas.


Bibliografia

  1. “História Geral da Aeronáutica Brasileira”, V. 1, Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica, Rio de Janeiro, 1991.
  2. “História Geral da Aeronáutica Brasileira”, V. 2, Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica, Rio de Janeiro, 1991.
  3. “História Geral da Aeronáutica Brasileira”, V. 3, Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica, Rio de Janeiro, 1991.
  4. J. Flores Jr., “Aviação Naval Brasileira”, Action Editora, Rio de Janeiro, 1995.
  5. 100 Anos da Aviação Naval no Brasil / FGV Projetos. – Rio de Janeiro:
    FGV Projetos, 2016.